
Vivíamos os quatro na casa dos meus falecidos avós, gente temente a Deus e ao Diabo. Era uma casa relativamente pequena, que ameaçava tornar-se uma ruína. Quando o meu avô tinha comprado o terreno, ficava bastante afastado da cidade. Ali ele cultivava a sua horta e criava galinhas. Lembro-me do seu sorriso aberto sempre que chegávamos de visita. Depois, tudo mudou. O meu avô faleceu, a minha avó seguiu-o pouco depois. A cidade já não estava tão longe: com o tempo, o terreno do meu avô tinha-se tornado num terreno dos arredores da cidade, apetecível para os agentes imobiliários, que, como aves de rapina, apareciam frequentemente com propostas tentadoras que o meu pai se via obrigado a recusar. Não era por falta de interesse: o meu pai queria vender o terreno para comprar uma casa melhor, mas tinha medo. Pavor, mesmo.
A razão estava num quarto que o meu avô sempre mantivera fechado. Todos sabíamos a verdade: no seu interior estava um jarro antigo, dentro de uma redoma de vidro. Diziam que o jarro estava amaldiçoado. O meu avô tinha chamado um padre que lhe dissera que o feitiço era demasiado forte. O jarro não poderia ser mexido, ou causaria mortes na família. Ele mostrou-o quando era pequeno. Esperava algo bonito ou tenebroso, mas não passava de um jarro de barro absolutamente banal – que nos impedia de vender a casa e o terreno.
Fomos viver para a casa dos meus avós depois da minha mãe ter perdido o emprego e os meus pais deixaram de poder suportar a renda do apartamento onde vivíamos. Lembro-me do dia da mudança como uma tragédia pessoal, tanto para mim como para o meu irmão. Berrámos com os nossos pais, só chorando por dentro porque o homem não chora, como o nosso avô costumava dizer. Iríamos perder os amigos, as idas ao cinema e ao salão de jogos. Porquê, mãe? Porquê, pai? Aos poucos fomos compreendendo as razões. Também eles prefeririam não morar numa casa velha, que ameaçava ruir a qualquer momento e onde a chuva entrava em catadupa pelos buracos do telhado de zinco. Mas não havia dinheiro para reparar a casa, pelo que teríamos de aguentar.
A chuva era tanta que havia baldes espalhados por todo o lado e a energia falhava a todo o momento. A resposta era a venda do terreno, mas o meu pai não queria quebrar a maldição. O jarro não podia ser mexido, pelo que tínhamos de aguentar. Não foram poucas as vezes que vi a minha mãe chorar com a miséria onde vivíamos. Pelo menos tínhamos um teto, dizia o meu pai. E um teto através do qual podíamos ver as estrelas, nos poucos dias de céu limpo.
Aos poucos, eu e o meu irmão fomo-nos acostumando com a situação. Brincávamos no quintal, que pelo menos era espaçoso. Jogávamos à bola quando o tempo deixava, inventávamos jogos quando chovia e a terra se transformava num mar de lama. Foi num destes dias que a desgraça se deu. A minha mãe tinha ido visitar uma ex-colega que estava no hospital. O meu pai tinha ido trabalhar. A casa ficara por nossa conta. O que fazer? Cansados de todos os jogos, decidimos entrar no quarto proibido e ver o jarro. O meu irmão sabia onde o meu pai escondera a chave. Esgueirou-se para o quarto dos nossos pais e regressou com a chave e um sorriso triunfante nos lábios. Abriu a porta, acendeu a luz e ali estava ele, no meio do quarto fracamente iluminado: o banal e horrível jarro. Para todos os efeitos, o nosso captor. Começámos a correr à sua volta, depois a luz falhou e eu fui contra o jarro. A redoma de vidro estilhaçou-se no chão e o jarro caiu. A luz voltou de seguida. Não havia forma de esconder o que tínhamos feito. O nosso pai regressou de seguida. Ficou horrorizado. Passado um mês, e como nada de mal acontecera, vendeu o terreno e agora estamos na nossa casa nova, com piscina e um quarto destinado ao jarro, para onde foi mudado com pompa e com a ajuda de dois padres e uma bruxa, para evitar males maiores.
Tema: Objeto
Olá,
Adoro esse humor sarcástico, faceiro. Um suspense danado, todo mundo esperando uma tragédia no final, e vem algo que nos arranca um sorriso. Acho que tem um dos melhores impactos do desafio. Algumas coisas na escrita me incomodaram, como a repetição do termo “pelo que”.
Boa sorte!
O gostinho de mistério criou a atmosfera perfeita para o desfecho. Me arrancou um sorriso se manteve fiel a proposta da história. Gosto dos personagens, mas o evento em si é o que prende a atenção (e a tensão). Talvez, se houvesse mais palavras, o clímax não surtiria tanto efeito, é esse tipo de história que imaginava encontrar em 700 palavras. Show!
Este aqui me pegou de uma maneira inversa ao primeiro conto publicado na sequência! Começa como uma história de terror, com um suspense bastante construído até uma virada final que é quase anticlimática, mas no fim tira um sorriso. Até um pouco de drama se experimenta durante a leitura, o que tomo por evidência de um bom controle da narrativa. Também se adequa ao tema muito bem, deixando o jarro praticamente dirigir o rumo da história. Jarro captor, ótima escolha de palavras.
Meu caro Obskuro, e eu aqui também com medo desse jarro maldito! E nada acontece… Puxa, muito legal isto. Gostei da sua história. Você soube narrar a história. Contar com maestria prendendo o seu leitor à trama. Além do mais, tem um bom domínio da língua, sabe jogar com as palavras. Parabéns e sucesso no nosso desafio.
Oi, Obkuro, tudo bem?
O conto aborda o tema “objeto” com criatividade e um toque de mistério.
A narrativa é bem conduzida e o que podem parecer a mim falhas de revisão talvez sejam apenas traços lusitanos. Não sei, mas nada me incomodou de fato.
O final deixou-me um tanto confusa. O vidro quebrou e o jarro caiu. O jarro não quebrou? Ou o substituiram por outro?
Esperava por um desfecho mais impactante, mas posso ter perdido algum significado atribuído pelo(a) autor(a)
Parabéns pela participação e boa sorte.
O conto é um primor na escrita. Percebe-se que houve uma revisão perfeita na pontuação, o que proporciona uma leitura sem qualquer entrave. A construção da narrativa também é muito bem trabalhada, fluente.
O tema escolhido pelo autor é “objeto”, e no caso, o “jarro amaldiçoado”. Interessante essa crendice irracional, a tal da fé ignorante que é construída sobre determinado objeto, um sentimento sem qualquer razão de ser, vindo não se sabe de onde. E isso é passado por gerações e gerações. Quem já ficou ressabiado de passar debaixo de uma escada? Quem já arrepiou com o piado da coruja na noite escura? Quem já se incomodou com o chinelo virado de cabeça pra baixo? Quem já ficou cismado ao quebrar um espelho? Que não come ave na passagem do ano? Quem já bateu três vezes na madeira? Quem pensa que o noivo não deve ver a noiva vestida antes da cerimônia? Então, de onde vem isso?! E a gente cria essas “falsas obrigações”, e sofre com isso.
Aprendi uma palavra nova: captor. Muito interessante. E percebi que a escrita carrega uma faceta lusitana, perfeita.
Menino, que sorte esse vaso ter sido quebrado! Que prosperidade trouxe pra família! Mesmo assim, a “crendice” continuou a ocupar lugar de destaque na nova casa. Afinal, “cautela e canja de galinha não faz mal a ninguém”, né?!
Parabéns pelo trabalho, Obskuro!
Boa sorte no desafio!
Abração…
Buenas, Obskuro!
De uma forma ou de outra, o jarro era uma maldição para a família. Pode não ser um objeto espiritualmente amaldiçoado, mas ele, com certeza, ditava o rumo e as ações da família. Isso não é praticamente uma maldição? Gostei muito da forma como abordou o tema. Criativo e inteligente. E bem escrito. Queria ver este conto num formato maior, mostrando as sequências de eventos, criando a dúvida se o jarro é ou não amaldiçoado de verdade, tudo através dos olhos de uma criança e sua visão literal de mundo. Senti-me um pouco afastado dos personagens. Não cativou, sabe? Mas isso é uma consequência da narrativa em formato de relato. Pois, pela escrita, nota=se que consegue mostrar a história se quiser.
Parabéns pelo texto. E vamos que vamos!
Olá. Achei o seu texto meio obskuro. Por um lado temos uma mistura entre o meio rural e urbano, uma tendência que é comum observar-se nos subúrbios das grandes cidades. Por outro lado temos a superstição, uma das forças mais poderosas da humanidade. É esta que controla as ações da família, algo que me incomoda profundamente. Esperava algo mais impactante no final, mas mesmo assim fiquei surpreendido – achei apenas que o final foi muito precipitado, devido, talvez, ao limite imposto no desafio.
O texto narra a história de uma família com dificuldades financeiras, que têm medo de vender a propriedade em que vivem por conta de uma suposta maldição referente a um jarro, que não pode ser mudado de lugar. A trama do conto é simples e linear. A narrativa me pareceu ainda verde, precisando de lapidação na construção de frases e personagens. O mote é bem promissor, no entanto, faltou um pouco mais de tensão para se criar um suspense mais sólido em torno do jarro maldito. O final é meio broxante. Boa sorte no desafio.
Oi Obskuro.
Uma boa história, com final apressado. Começou bem, com uma ótima premissa, mas terminou de forma bem abrupta.
A escrita é boa, embora algumas expressões repetidas chamem a atenção, como por exemplo “pelo que teríamos de aguentar” e “pelo que tínhamos de aguentar” e revelem necessidade de uma revisão atenciosa.
E, se o jarro foi movido e nada aconteceu, por que não se livrar dele de uma vez? Isso ficou sem explicação.
Boa sorte.
Kelly
As descrições e ideia são corretas, um início de história interessante, com suspense,
mantendo a curiosidade do leitor para saber o que contém no quarto e quando sabe,
espera que o jarro faça algo fantástico, surpreendente, para realizar os desejos da família, por exemplo,
no entanto, a história termina completamente daquilo que se esperava.
O pai vendeu o terreno e com o dinheiro comprou uma casa melhor, então,
não havia nada com o jarro, que permanece apenas como um jarro antigo com fama de mal-assombrado.
Boa tarde, Obskuro!
Que tema simples e, ao mesmo tempo, complexo. Você optou por abordar pela via do mistério, até o fim ficamos na dúvida se se trata de superstição ou se há, de fato, maldição no objeto. Bom deixar assim mesmo em aberto.
A escrita do conto ficou um pouquinho perdida, talvez pela revisão, talvez por ser de uma língua estrangeira próxima como o português europeu ou africano. Mas o que mais pegou par mim foi o final. No último parágrafo, os filhos estavam brincando de bola, cansam-se, abrem o objeto, não conseguem esconder a traquinagem dos pais, todos descobrem que nada ocorre, se mudam para outro casa, com a ajuda de um padre e uma bruxa. Nisso tudo, ainda há espaço para reflexões do narrador. Essa literatura rápida pode ser interessante quando harmônica com o restante do texto, aqui ela contrasta com o que vinha sendo apresentado.
Faltou também nos deixar cativar pelas personagens ou mesmo pelo jarro. As longas descrições do começo não contribuem para nos dar intimidade com o protagonista e sobre o objeto, não vemos e nem sabemos nada sobre a potência maléfica que ele guarda.
De um modo geral, a história é promissora, poderia se encaixar no terror se o autor optasse por fazer, do jeito que está me deu a sensação de ter ficado no meio termo entre uma grande história e um relato comum.
Oi Obskuro! Tudo bem?
Gostei do texto, é bem escrito, está dentro do tema e achei bastante criativo.
Encontrei alguns errinhos de revisão. Revisaria os seguintes trechos:
“Fomos viver para a casa dos meus avós depois…” – seria melhor viver na casa dos meus avós. Para a casa acredito ser uma construção muito curiosa além de me soar mal.
“Berrámos com os nossos pais” – na grafia correta da palavra berramos, não há esse acento agudo
“Jogávamos à bola quando o tempo deixava” – a crase, nessa caso, não é necessária
“Começámos a correr à sua volta” – a grafia correta da palavra é sem o acento agudo também “começamos”
“A luz voltou de seguida.” e , logo em seguida no texto, “O nosso pai regressou de seguida.” – não sou grande fã dessa construção, para falar a verdade nunca havia lido anteriormente e não encontrei em gramáticas numa pesquisa rápida no Google. De qualquer maneira não acho que seja estilisticamente bom e a repetição logo em seguida empobrece o texto.
Parabéns pelo texto e boa sorte!
Temos uma pequena história contada numa narrativa linear.
Me permita uma sugestão: vale atentar para a teoria do conto, ler sobre a escrita de contos.
Pode eliminar os excessos, dizer o que precisa ser dito em menos palavras.
Cuidado com o uso dos verbos e com o uso excessivo do pronome relativo ‘que’.
Sugiro uma revisão gramatical em todo texto.
No final, a bruxa surgiu de repente, e ficou sem qualquer ligação com aquilo que foi narrado anteriormente.
Valeu a leitura!
Olá, Obskuro!
Parabéns por ter escolhido um tema difícil! Eu, particularmente, duvido que conseguiria escrever a história em torno de um objeto e você cumpriu com o objetivo ao abordar o jarro. Contudo, o texto apresenta alguns desvios gramaticas e de revisão, conforme foi dito em comentários anteriores. Peço que tenha cuidado ao colocar ênclise nos verbos, pois alguns estão equivocados e atrapalham a fluidez da leitura. Além disso, achei o final muito apressado e pouco aprofundado, você poderia ter explorado melhor o desfecho da sua história, dando mais detalhes sobre a venda da casa, o que aconteceu após a abertura e queda do jarro, entre outras partes que poderiam contribuir para criar uma leitura mais agradável.
Sucesso pra ti!
Boa sorte!
Olá, Obskuro! Vale ter atenção à revisão. Evitar ambiguidades (quem era temente a Deus: os quatro que viviam na casa ou os falecidos avós?), repetições (cidade) / Quando meu avô comprou (e não “tinha comprado”) / tinha se tornado (“e não tinha-se tornado”) / frases estranhas (“fomos viver para a casa de meus avós”) / “berrámos” / Por que, mãe? Por que, pai? (pergunta) / falta de vírgulas / captor (não entendi o que é).
Ao final do conto, fiquei com a impressão de uma prosódia hispana, o que pode explicar algumas construções. Se for o caso, seria interessante passar pela revisão de um lusofalante. O conto ficou com cara de relato, de reminiscência. Nesse sentido, acho que poderia explorar mais a visão infantil, distorcida e um tanto exagerada das coisas. O final tem certa ironia, mas continua temente às superstições. acho que dava pra ter explorado mais isso.
Olá, Obskuro! Tudo bem?
Tema difícil… Mas possível.
Não sei o que pensar do seu conto. É estranho. Não sei explicar… Achei que o final seria outro, que eles iam ver que o vaso não tinha poder e jogar fora. Sei lá.
De qualquer forma o conto está bem escrito, o tema foi bem abordado e o limite não ajudou nem atrapalhou. Por mais que o conto tenha começo, meio e final, não parece que a história está completa. É só uma sensação que tive ao terminar a leitura 🤷🏻♀️
Boa sorte no desafio!
Até mais!