Spread the love

A cruzada de Zender │ Affonso Luiz Pereira

“Bip”

A primeira vez que ouviu o bip, Zender não se deu conta do som ter vindo de dentro de sua cabeça. Levou um bom tempo para entender isso. Havia a possibilidade remota do seu chip neural ter entrado em curto. O implante talvez apresentasse algum dispositivo de alerta a fim de identificar incorreções. Mas caberia aí uma pergunta: o que poderia ter levado a colapsar o diminuto circuito incrustado no seu cérebro para lhe causar tamanho transtorno? 

Estava tentando se recuperar daquela baderna mental. Lapsos de memória atrapalhavam o seu raciocínio a todo momento. Tomara o cuidado de passar a mão na cabeça à procura de possíveis traumas e, no entanto, não encontrara nenhuma lesão, embora sentisse uma dor ampla por todo o couro cabeludo.

Ele olhou ao redor e percebeu estar sentado à mesa do “Casablanca”. O bar da boate encontrava-se com pouca gente àquela hora da madrugada. A densa nuvem de fumaça dos cigarros, multicolorida por luzes em movimentos aleatórios que varriam todo o salão, pairava concentrada rente ao teto. Apenas uma garota, de peitos à mostra e biquíni minúsculo, rebolava num tablado de pole dance a seduzir os últimos bêbados solitários da noite.

A fauna noturna dentro da boate, a despeito de estar à míngua, movimentava-se no empenho dos poucos homens e mulheres à caça apressada de encontrar companhia de última hora, fosse por diversão ou dinheiro. Zender, mesmo confuso das ideias, tinha o vago discernimento de estar ali por causa da obsessão do seu desejo. Perdera a noção de quanto tempo encontrava-se à mesa bebericando whisky à espera dela. Olhou para o relógio, frustrado, e decidiu ir embora.

Então, de repente, ele a viu surgir em meio à penumbra de um dos cantos mais distante do salão. Ela movia-se naquele andar sexy bem conhecido, dentro de um vestido preto, curto, harmoniosamente colado à pele, e vinha na sua direção. Era Lulu White, a garota de programa mais cobiçada do pedaço.

— E aí, bonitão, você não quer me pagar uma bebida? – ela perguntou, sentando-se à mesa.

Zender a olhou com atenção. Aqueles grandes olhos artificialmente arredondados de um azul intenso, último lançamento da linha de implantes oculares Anime 2.0, fixaram-se nele. Percebeu as oscilações do brilho das pupilas dela aplicando filtros a fim de enquadrá-lo em meio às mudanças de luzes e sombras do lugar. Ela levou a piteira eletrônica à boca. Deu uma profunda tragada. Esperou em silêncio o olhar atento dele avaliando, provavelmente, se ele a achava bonita.

— Gostou, detetive? – disse fazendo beicinho de menina levada.

— O quê?

Zender ignorou a provocação sensual porque não conseguia desviar a atenção daquele par impressionante de olhos azuis. A vantagem dos implantes era o fato do usuário não perder nada do objeto sob sua mira, inclusive a garota podia saber, se quisesse, a temperatura corporal dele. A visão infravermelha era apenas um dos múltiplos recursos dos notáveis glóbulos oculares Anime 2.0.

“Bip”

Ele fechou os olhos. Sacudiu a cabeça tentando diminuir o desconforto do emaranhado de pensamentos fora de ordem.

— O que foi, detetive? Você não está se sentindo bem?

— Você ouviu o som de um bip?

A garota apenas inclinou a cabeça de lado, intrigada.

— Não. Não ouvi nada. Pode ser algum efeito da música ambiente.

Em seguida ao comentário dela, um pacote de lembranças irrompeu de algum lugar do fundo de sua mente confusa. A princípio, ficou surpreso! Tenso! Considerou o fenômeno ser efeito colateral de reposição anamnese automática do chip neural avariado. Nervoso, pegou o copo de whisky na mesa. Sorveu dois goles rápidos. Algo muito estranho estava acontecendo com ele.

Reposição anamnese ou não, as memórias mais recentes estavam vindo à conta-gotas. Apresentavam-se numa escala ascendente de um mês atrás até aquele momento. Começou a gostar da situação. Depositou o copo à sua frente e estalou a língua satisfeito. Um sorriso bobo de confiança brotou-lhe nos lábios.

— Qual é a graça, bonitão?  – disse ela, inclinando-se por cima dos cotovelos escorados na mesa, de modo a exibir o generoso decote do corpete.

— Você tinha baixa visão quando resolveu colocar estes implantes? – ele perguntou de primeira, direto ao ponto, ignorando o modo erótico dela chupar a ponta da piteira eletrônica.

— O quê? Qual é, cara? O que isso tem a ver com o nosso lance aqui? – ela respondeu, irritada. Jogou o corpo para trás de encontro ao encosto da cadeira, abriu as palmas das mãos para os lados, ainda segurando a piteira. – Tu tá maluco? Tá a fim de transar ou não? Tenho mais o que fazer.

— Eu quero saber se você tinha baixa visão quando resolveu colocar a porra destes implantes? – Zender berrou com raiva, de súbito, dando um murro na mesa. O copo de whisky pulou miúdo e derramou a bebida na toalha branca. – Responda!

Apesar de ter se levantado da cadeira assustada, a fúria repentina do esquisitão não atraiu a atenção dos clientes. Os dois seguranças perto da entrada não deram sinal de perceberem a encrenca. O barman, se ouviu alguma coisa, fez cara de paisagem.

— Senta aí, cacete! – apontou à cadeira rispidamente.

Ela sentou-se no mesmo instante, colocando as mãos nos joelhos. Seus olhos postiços começaram a piscar fazendo ruídos de pequenos “cliques” numa velocidade nervosa impressionante, porém não se desviaram dele. A sensualidade, agora, havia lhe fugido do rosto dando lugar a um misto de surpresa e medo. Ah, ele conseguira o seu merecido respeito, pensou.

— É bom ver o mundo em resolução 4k, não é? – disse em tom sarcástico.

— Eu…

— Então, como é que é? Você tinha baixa visão ou não? Era cega, por acaso?

— Eu… eu…

— Ok, não precisa responder. Eu já sei! Você não precisava dos implantes pra enxergar melhor, não é mesmo? Lulu, você não passa de uma otaku ignorante, estúpida, assim como são as milhares de putas e adolescentes desmioladas que vomitam esta cultura japonesa em nosso país há décadas. Você quer ficar parecidinha com a Sailor Moon, é? Grande coisa isso!

A garota se empertigou na hora, a expressar caras e bocas de ofendida. Zender sorriu por dentro, satisfeito. O medo dela virou indignação. Ela fez menção de se levantar para ir embora, mas o seu olhar de macho determinado não permitiu, ou pelo menos assim acreditava. Antes de lhe jogar outro insulto na cara, Lulu lhe devolveu o troco de modo igualmente sarcástico, imitando a voz dele.

— Olha só quem fala! E você não passa de um xenófobo bem escroto, isso sim! Não tem moral pra falar de implantes, porra. Você tem um chip neural bem aí dentro desta tua cabeça confusa.

“Bip”

Algo estava errado ali! Como ela poderia saber do implante neural? Ora, aquilo era bem diferente! O chip sempre oferecera-lhe suporte para lidar com o seu déficit de atenção e dislexia. Aquela puta não tinha o direito de comparar um dispositivo neural de função auxiliar importante de aprendizado com melhorias estéticas de gosto duvidoso. Isso não era certo.

— Afinal, diz aí, qual é a tua? O que você quer de mim? – ela perguntou, empinando o nariz em postura desafiadora.

Zender colocou os cotovelos em cima da mesa, uniu as mãos, levando-as embaixo do queixo. Em seguida, respirou fundo e se inclinou à frente. Estava com raiva. Muita raiva! Não gostou da petulância daquela vadia em querer lhe passar um pito assim, à vista de todo mundo. “Você é um xenófobo. Não tem moral pra falar de implantes”. Foi bem isso o que a ordinária lhe jogou na cara. Ah, mas ela ia ver só com quem estava lidando.

— O que eu quero de você é simples, minha querida. Eu quero é arrancar estes teus dois olhos azuis imprestáveis do meio da tua cara. Eu os coleciono, sabia? A polícia anda me procurando por aí já faz um bom tempo…

— Mas você é a polícia!

— Pois é, veja só você como são as coisas… eles não entendem a minha cruzada contra essas megacorporações que estão estragando a geração de hoje. Eu, sinceramente, não sei aonde vocês querem chegar com toda esta merda! Prostitutas, meninos e meninas adolescentes, até marmanjos casados querem ficar parecidos com seus heróis de animações japonesas. Isso é um absurdo!

— Você é doido, cara!

— Aí é que você se engana, minha querida. A Megavox Hightech Implants, do grupo Google, já não vale mais nada na bolsa de valores. E estes olhos da Sailor Moon, aí grudados na tua cara, não são mais prioridades de venda aqui no Brasil, sabia? Meu trabalho está desencorajando à aquisição dessas porcarias estéticas inúteis – disse apontado para os olhos dela.

Zender, subitamente, ouviu três bipes espaçados numa sequência rápida, oriundos das profundezas de sua consciência e, com eles, a mente abriu-se para um novo patamar. Quase uma epifania se apossou dele, visto que mais algumas lacunas de memória foram preenchidas. O quadro geral começava a lhe fazer sentido.

Antes mesmo de saborear a própria façanha de realizar algo notável, sentiu uma presença ameaçadora no local. No entanto, tal impressão, diante das novas informações, pouco se lhe importava. Apenas sorriu, porque ia ser divertido.

Lulu voltou a atenção, ele percebeu, para algum ponto às suas costas e se levantou depressa. Desta vez, porém, a garota não estava assustada, pelo contrário, parecia confiante!

— Onde estão os corpos das garotas? – disse uma voz rouca bem conhecida.

Zender nem precisou se virar para saber de quem procedia aquela voz! Só podia ser do investigador de homicídios Noah Morgado, do departamento de polícia de São Paulo, um colega irritante de profissão. Levantou-se devagar, virou-se, e topou de frente com uma pistola apontada na sua direção. Ah, realmente ia ser divertido.

Os clientes do bar, ao perceberem a cena, afastaram-se devagar com expressões preocupadas em levar uma bala perdida na cabeça. Os dois seguranças apenas olharam indecisos sobre o que fazer. O barman largou a garrafa de conhaque em cima do balcão para sumir por uma porta ao lado.

— Filho da puta! Quem poderia imaginar que um dos policiais mais simpáticos da corporação seria, ao mesmo tempo, o mais hediondo serial killer do Brasil – disse Noah com raiva, entredentes, mexendo nervoso o cabo da arma.

— Olha, não que isso me importe tanto assim, Noah, mas como você descobriu depois de todo esse tempo? – perguntou, expressando a fisionomia dissimulada, de pouco-caso, porque queria continuar aquele joguinho com a intenção de ver até aonde ia a sua criatividade.

— Eu te perguntei onde estão os corpos das garotas? – berrou o policial agitando a arma, impaciente.

— As fotos na Internet enviadas às famílias não foram suficientes? – Zender respondeu de modo cruel, quase em tom de deboche. – Então, diga-me lá, como você descobriu?

— Jamais entrei em contato com você na tua casa por videoconferência, porém ontem precisava te falar da pressão da Magavox em cima do nosso departamento. A câmara do teu monitor revelou a boina verde atrás de você, na prateleira da tua biblioteca.

— Existem milhares de boinas verdes para vender neste país.

— Sim, mas aquela tinha o nome “Emília” bordado na frente. Essa noite, quando você saiu de casa, eu revirei tudo até encontrar o porão onde descobri os implantes extraídos dentro de vidros de conserva.

— Hum… realmente foi um vacilo meu. A boina! Que merda! Não resisti em ter sempre à vista uma lembrança da minha primeira princesinha estúpida!

Noah tomou aquilo como provocação e avançou três passos na direção do assassino. Encostou a arma na sua testa. Retirou as algemas de trás do cinto.

— Você está preso, filho da puta!

Zender só ofereceu ao adversário um sorriso de troça. O policial tolo nem sabia onde se encontrava, o pobre coitado. Estava na hora de dar um choque de realidade naquela figura patética, fruto de sua imaginação criativa. Tinha de admitir, modéstia à parte, a mente dele era extraordinária, porque conseguia criar o comportamento real daquele merdinha persistente, gerar aquele ambiente noturno em detalhes, elaborar as conversas de modo convincente.

Ora, ele estava se divertindo muito!

— Olha só, Luluzinha, o otário aqui acha que pode me prender ou me matar dentro do meu sonho lúcido. Veja quanta idiotice.

— O quê? Sonho? Do que você está falando? Eu não…

Zender, numa velocidade incomum, aplicou um golpe de caratê no centro do peito de Noah, jogando-o a vinte metros de distância, por cima de mesas e cadeiras. Surpreso com o poderoso ataque, em meio ao caos de gente correndo para todos os lados, Noah tentou rapidamente se levantar. Apesar dos esforços, não fez mais do que se afundar no piso do salão, como se estivesse em luta desesperada contra um lago de areia movediça.

Noah, simplesmente, foi absorvido pelo assoalho de madeira envernizada do Casablanca.

— Aqui… quem manda sou eu – disse Zender com orgulho. Contornou a mesa e parou ao lado da garota.

“Bip”

— Vamos embora, querida, está na hora!

Lulu nem sequer ofereceu resistência. Ele a arrastou pelo braço para os fundos da boate e, como num passe de mágica, saiu sozinho pela porta de um casebre velho, em local ermo e distante. Era bem onde queria estar. Observou atento o terreiro tomado pelo capim alto, iluminado por um círculo de luz frágil vinda de uma antiga lâmpada incandescente. Sabia que no entorno do terreiro, para além do círculo de luz, por de trás da cortina escura da noite, havia milhares de quilômetros de fazendas e plantações de milho a se perderem de vista durante o dia.

Ele reconheceu logo o lugar. Era o sítio da avó.

A velha, ao morrer, deixara-lhe a chácara como patrimônio de herança. Vinha ali duas vezes por mês na intenção de manter o lugar minimamente habitável, marcar presença, afugentar qualquer aventureiro que quisesse tomar posse da sua propriedade por usucapião.

A trinta metros distantes de onde estava, à meia-luz oriunda da lâmpada fixada no caibro da varanda, Zender entreviu o contorno do velho poço artesiano. Havia tempo o poço secara por causa da estiagem e falta de manutenção. Elas estavam lá embaixo, bem no fundo, amontoadas feito bonecas esquecidas. Algumas eram velhas demais em relação ao tempo, já decompostas, fétidas, e as mais novas ele ainda podia contemplar, maravilhado, as faces esburacadas das quais arrancara os olhos postiços.

— Então é aqui que você escondeu os corpos! – Zender ouviu a voz embargada atrás dele.

— Sim, a Emília, a tua irmãzinha querida, também está lá – ele provocou, de mão cruzadas às costas, apontando o queixo para o poço. – Você não tem chance contra mim aqui.

— Será mesmo?

Zender virou-se e viu Noah se afastar do umbral da porta. Desta vez, ele não puxou arma nem algemas, apenas ou encarou com raiva contida e disse:

— Você sabia que aqui o tempo é relativo, não é? Digo isso porque também possuo um chip neural.

— E daí? – deu de ombros. Não queria demonstrar o início de preocupação. O merdinha também usava o mesmo dispositivo intracraniano que ele. Na verdade, pensando bem, a maioria dos policiais da nova geração usava! Não precisavam conferir arquivos de várias investigações em andamento. Tudo muito pragmático.

— Esse bip intermitente aí dentro da tua cabecinha doente não te parece estranho, não? – perguntou Noah enquanto levava as mão à cintura. Zender detestou a confiança desagradável dele.

— O que você quer dizer com isso?

— Pois é, os médicos, infelizmente, dizem que você tem uma boa chance de sobreviver, apesar do tiro que tomou no peito lá no Casablanca. Ainda pesa o fato de você ter batido com a cabeça na quina da mesa quando caiu. Uma contusão feia! Muito sangue, um horror!

— Isso é mentira, eu…

— Você está em coma induzido há duas semanas, seu puto! Tem o casco duro. De lá pra cá tem repetido a cena da boate muitas vezes. Pode ser o chip tentando recompor partes afetadas pela hemorragia nesta tua cabeça de merda, vai saber. Mas é a primeira vez que vem aqui! 

— Isso é mentira – Zender disse com a voz estrangulada de medo, dando dois passos para trás.

— Não é mentira, não! Estou sentado num sofá bem ao lado da tua cama, no Centro de Terapia Intensiva – disse Noah abrindo um pequeno sorriso de satisfação. – O sono REM é fácil de induzir pelo chip neural, como sabe, e estou conectado a você pelo suporte de vida, via Wi-Fi Direct. Agora, presta atenção nos bips. Estes são os teus sinais vitais, filho da puta. Por isso, escute bem!

“Bip… bip… bip”

Zender se contraiu de medo. Ele estava seriamente em perigo.

— O respirador artificial é o que está te mantendo vivo – continuou Noah, satisfeito em ver a cara de assustado dele. – As enfermeiras nunca estão por perto, sabia? O policial responsável pela tua guarda, entediado, vive percorrendo os corredores do hospital pra cima e pra baixo.

— Eu quero viver! – Zender gritou desesperado. – Você não é Juiz pra decidir nada. Tenho direito a um julgamento justo!

— Você sempre soube que a Emília era a minha irmã, não é? Mesmo assim entrou para a polícia, infiltrou-se na minha delegacia e, claro, estava sempre a um passo à frente das investigações. Briguei pra ficar com o caso, você sabe bem disso. Queriam me afastar da tua cola por causa dela. Prometi não levar o trabalho para o lado pessoal, mas…

— Mas o quê?

— Você não merece viver!

“Bip… bip… bip”

Zender viu, estarrecido, o corpo de Noah desaparecer gradualmente.

— Não, você não pode fazer isso! – urrou virando-se para todos os lados em pânico. Depois, começou instintivamente a andar depressa em direção ao poço. – Eu quero viver! Tenho transtorno mental! Preciso de tratamento médico! Elas são minhas! Minhas, desgraçado!

Antes de chegar perto do poço, o mundo de Zender apagou-se de súbito e, em meio à escuridão do vácuo eterno, ele ainda pôde ouvir por alguns segundos os últimos sons da vida real se escoando lá fora.

“Bip… bip… bip… biiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii…”

12 comentários em “A cruzada de Zender │ Affonso Luiz Pereira”

  1. Olá, Arthemis!

    Conto bem escrito. Notei alguns desvios gramaticais no desenvolvimento, mas isso não comprometeu a minha experiência como leitor. Também achei que os diálogos ficaram superficiais e muito expositivos, algo que poderia ser evitado com uma revisão mais aprofundada.

    Boa sorte!

  2. Olá, Arthemis. Beleza, cara?

    Resumo: um policial assassino persegue suas vítimas numa São Paulo futurista. No início, ele parece apenas alguém à parte do sistema, lutando por suas próprias convicções contra um mundo exageradamente “tecnologizado”. Aí, percebemos que ele é um assassino. Do meio pro final, o conto vai tomando um aspecto fantasioso, quase nonsense, e percebemos que tudo se trata de um sonho.

    Comentários: caramba, que conto bom, Arthemis! Elementos meio Bukowskianos, um clima noir, plot twists pra todo lado, um desfecho surpreendente que inclui algo fantasioso, sonhos… como que não gosta disso? Legal demais isso de o herói (ou quase isso) se mostrar o vilão. Ficamos pensando pra quem torcer, etc. Há frases lindíssimas como “iluminado por um círculo de luz frágil vinda de uma antiga lâmpada incandescente”.

    Há poucas revisões a serem feitas. P ex: “à conta-gotas” não exige crase. “Aquela puta não tinha o direito de comparar um dispositivo neural de função auxiliar importante de aprendizado com melhorias estéticas de gosto duvidoso”; essa expressão “um dispositivo neutral de função auxiliar importante de aprendizado” está no mínimo ambígua. “Desencorajando a aquisição” também não exige crase. Em “e as mais novas ele ainda podia contemplar, maravilhado, as faces esburacadas das quais arrancara os olhos postiços”, falta uma preposição: “e Das mais novas ele ainda…”

    Outro pequeno estranhamento é com o contraste entre um narrador que, ao longo de todo o texto, usa, p ex, o pretérito mais que perfeito, ênclises (p ex “A velha, ao morrer, deixara-lhe a chácara”), o que indica certa sofisticação no falar, e que, depois, diz algo como “Apenas sorriu, porque ia ser divertido”. “porque ia ser divertido” me soa um deslize na forma como o narrador está contando a história. A menção “por usucapião” também me soa desnecessária.

    Em outro lugar, a fala do protagonista também me pareceu destoar da caracterização até então feita dele: “— Eu quero viver! – Zender gritou desesperado. – Você não é Juiz pra decidir nada. Tenho direito a um julgamento justo!”. Não pareceu que o protagonista criado até esse ponto dissesse isso.

    Por fim, o conto tem aproximadamente 40 pontos de exclamação hehe. Isso não tem como estar certo.

    Erros importantes na escrita, mas que, dada a extrema qualidade do enredo, não tiraram o brilho deste que, para mim, até agora, é um dos melhores contos do certame.

    P.S.: destaque também para um dos melhores parágrafos iniciais que eu com certeza lerei por aqui!!!!

    p.s.2: Parabéns, e boa sorte!!

  3. Um cybernoir, que legal! Gostei deste texto, a escrita é aǵil, estabelecendo rapidamente lugar, situação dos personagens e aspectos desse mundo em que vivem. Analisando, os diálogos me intrigam, pois soam naturais, mas ao mesmo tempo parecem saídos de personagens artificiais. Isto é, torna-se que evidente que o diálogo quer mais pôr os personagens em uma situação de embate do que realmente trazer informações ou mensagens significativas. A discussão entre policial e prostituta é envolvente, apesar disso, e acaba servindo a nos situar sobre a natureza da realidade em que estão os personagens, o que, por sua vez, nos engana com mais uma reviravolta que, sem aviso – como deve ser – nos dá uma rasteira no final. O texto ter surpresas dentro de surpresas é bom sinal e demonstra uma autoria no controle da narrativa, ainda que a escrita acelerada acabe por atropelar a construção de personagens mais sórdidos.

  4. Olá, Arthemis, deusa das caçadas e protetora das crianças. Este seu conto trouxe-me à memória um dos livros de ficção científica mais estranhos que li, Ubik, de Philip K. Dick. Este livro é passado em ambiente da chamada “meia-vida”, uma forma de suspensão criogénica onde as pessoas têm um nível de consciência e conseguem comunicar. No entanto, vivem numa realidade paralela, habitada por outras pessoas que estão na mesma situação. O não saber o que é a realidade ou não é um sentimento que foi bem explorado no seu conto. Como notas mais negativas, o excesso de coloquialismo e alguma incoerência na caracterização das personagens. O narrador é caracterizado como policia simpático, mas é arrogante e violento.

  5. Achei o texto um tanto confuso, difícil de entender por conta do ritmo tortuoso e de uma escrita descontínua. No final, da a entender que em parte isso se deve pelo fato da história se passar dentro de um sonho, mas acho que poderia ser melhor executada. É uma história interessante, apesar de abusar dos clichês do gênero noir, e dos diálogos altamente expositivos, mas que tem espaço para ser melhor trabalhada, talvez em um texto com um tamanho maior, em que os detalhes não fiquem tão apressados.
    Boa sorte

  6. EMA (Escrita, Método, Adequação)
    E: Uma escrita mais visceral e ligeira, mas que carece de verossimilhança em algumas passagens. Acontece sim, de algumas pessoas passarem de um estado a outro de súbito, mas na escrita, isso precisa acontecer de modo suave, ou por algum motivo na construção do cenário. Isso ocorre algumas vezes, mas não em todo o texto. Há várias reações exageradas, caricatas, mas que são facilmente contornadas com uma pequena revisão. Algumas opiniões dos personagens pareceram mais do autor(a) do que do próprio indivíduo, por isso temos que ser mais sutis.
    M: Tem uma boa dose de suspense antes da reviravolta e, tirando os problemas acima, contem uma boa estrutura. O final é interessante e a mudança de ponto de vista convence.
    A: Se você conhece animes, isso me soou mais uma versão de Cyberpunk, com trejeitos de Sword Art Online. Tem algumas pitadas de Noir, mas não sei se o conjunto se encaixaria plenamente em algum dos três temas propostos. Tem viagem no tempo? Não. Tem lugares abandonados? Não. Tem um pouco de Noir? Tem.
    Nota: 7,5

    1. Victor, devo apenas lembrar-lhe que o protagonista deste conto se trata de um psicopata, não é uma pessoa normal, e mudanças suaves de comportamento podem não se aplicar às pessoas assim. Ademais, quanto as reações exageradas, caricatas, você precisa considerar o contexto da situação: é a mente de um psicopata que se acha muito superior a todos os outros, e seu comportamento ocorre dentro de sua própria mente onde ele passa a ser achar um Deus.

      Sobre a questão de você me chamar de xenófobo, você não foi muito educado em seu comentário porque isso aqui é texto de ficção científica, não é um artigo de opinião. Apenas quis encontrar um argumento pela compulsão do assassino em querer extirpar os olhos postiços das vítimas. Embora goste de alguns seriados, principalmente os de FC, não sou fã de carteirinha de animes, é um fato, mas respeito a preferência das pessoas no que concerne a religião, política, futebol e entretenimento cultural. Achei de mal gosto este comentário porque você não me conhece para me julgar assim desta maneira. E quanto a nota agradeço pela consideração, embora ela devesse ser emitida em postagem apropriada, ainda não publicada pelo administrador.

  7. Andre Domingos Brizola

    Salve, Arthemis.
    Um conto que começa de maneira bastante desinteressante, mas que é envelopado por um arremate bem feito e que conseguiu transformar as minhas primeiras impressões. Não é exatamente original, mas foi um recurso bem utilizado que realmente transformou o conto.
    Na minha visão, a parte gramatical merece uma revisão mais atenta para deixar tudo mais regular. Tem uma ou outra coisa que precisa ser revista como, por exemplo, o indicador de crase em “desencorajando à aquisição”, e um “juiz”, com letra maiúscula.
    Com relação à parte estilística, acredito que o texto poderia ter passado por uma edição que priorizasse um pouco mais a dinâmica, deixando de lado certos exageros que não contribuem com o enredo e pouco acrescentam para a caracterização da cena. Uso dois exemplos do mesmo parágrafo: “golpe de caratê no centro do peito de Noah” e “lago de areia movediça”. Numa cena real, se o golpe de caratê acerta o centro do peito, ou um pouco pra esquerda, ou pra direita, é pouco importante. Já o que seria de fato relevante para a descrição desse detalhe da cena, se um golpe com punho ou com o pé, não é dito. Com relação ao lago de areia movediça, penso ser dispensável sabermos que se trata de um lago. A menção à areia movediça já seria suficiente para conhecermos a situação. E esses são dois exemplos de situações que ocorrem durante o texto todo.
    O enredo começa bastante fraco e desinteressante. Uma conversa de um assassino com sua provável vítima. O que revitaliza a trama é descobrirmos que se trata de uma conversa na cabeça do assassino, mas não em sua completa dominância, e sim sob a frágil linha da vida e morte. Uma reviravolta que faz a primeira metade do texto ter algum sentido em sua fragilidade textual.
    No geral é um conto que agrada mais para o final, quando temos acesso a todas as informações. Mas sua leitura é um tanto arrastada pela escolha estilística, que deixa as descrições um tanto quando exageradas. E, sim, se adequa ao tema noir.
    Bom, é isso. Boa sorte no desafio!

  8. Um serial killer à caça, prestes a atacar é impedido pela polícia, em um clima cyberpunk noir.

    Muito bom! Gostei da estranheza que toma conta da história desde o começo e vai se intensificando até o final surpreendente. Em alguns momentos, achei que estivesse dentro de um sonho, ou de uma alucinação aleatória, até entender o que realmente se passava. Uma alucinação? Ok, mas é um pouco mais que isso: uma forma pouco ortodoxa de dar às famílias das vítimas um fechamento.

    O enredo é bem amarrado e o ritmo do conto também é excelente, um thriller muito interessante.
    Parabéns e boa sorte!

  9. Afonso Luiz Pereira

    “A cruzada de Zender” explora o gênero de FC cyberpunk, além de inserir elementos pertinentes ao estilo noir em seu enredo. É uma mistura interessante que pode não agradar os puristas, fãs do noir, mas funcionou muito bem, por exemplo, no filme “O Caçador de Andróides”. A trama tem a ver com um serial killer desmemoriado que se vê às voltas dentro de uma boate à procura de uma vítima para satisfazer sua compulsão assassina, matar garotas que usam implantes oculares. No entanto, ele parece sofrer algum distúrbio do mal funcionamento de um dispositivo intracraniano (chip neural), o que atrapalha o seu raciocínio. Gostei do enredo, bem escrito, em que se observa, vez por outra, a 1ª pessoa do discurso colada a 3ª, e tal recurso dá maior consistência ao protagonista psicótico. Há alguns deslizes ortográficos, mas nada que prejudique o envolvimento da história. Faço votos de boa sorte no desafio, meu caro autor.

  10. Assassino em série é perseguido pela polícia.

    Bons elementos noir: mulher fatal; meio, corrupção e investigação policial; ambiente noturno deteriorado. Bons elementos de ficção científica. Introdução muito boa, com ótimo diálogo. Desenvolvimento com perda significativa de ritmo: a escrita se torna apressada e os erros se avultam – os nomes dos personagens remetem a estrangeirismos, mas a estória é ambientada em São Paulo, uma importação à lá “Zona Franca de Manaus” (monta, etiqueta e chama de nacional); há crases equivocadas (“apontou à cadeira”, “desencorajando à aquisição”); há redundâncias (“expressando a fisionomia”, “patrimônio de herança”, “os clientes do bar, ao perceberem a cena, afastaram-se devagar com expressões preocupadas EM LEVAR UMA BALA PERDIDA NA CABEÇA” – toda essa caixa alta não precisava ser explicitada); há academicismos (“visto que”, “antes mesmo”); há erros de revisão (“apenas ou encarou”). Se menos açodado na escrita e no desenvolvimento, seria meu conto favorito até o momento. Mas gostei do conto, e o desfecho divertiu.

  11. Antonio Stegues Batista

    A CRUZADA DE ZENDER- A história se passa num futuro não muito distante, quando as pessoas passam a usar próteses de alta-tecnologia e chips implantados no cérebro. Zender é um homem que usa um chip neural capaz de neutralizar seu déficit de atenção, também armazenar informações e jogos virtuais.
    Zender é um psicopata, um serial Killer. Não se sabe se é assim desde sempre ou depois do implante do chip. Zender é xenófobotech, odeia tecnologia estrangeira. Ele passa a matar mulheres que usa os implantes oculares. Não se sabe porque só mulheres, mas talvez, como todo psicopata, ele tenha um fetiche, um gosto pessoal.
    A cruzada de Zender não tem como meta, defender princípios cristãos, como os soldados francos que tinham como objetivo conquistar e ocupar Jerusalém. No sentido figurado, a cruzada de Zender é uma guerra particular, insana, incoerente, concebida por sua mente doente.
    Na trama, Zender foi ferido num confronto com a polícia e se encontra em coma num hospital. Um investigador da Polícia, que teve a irmã como uma das vítimas de Zender, vai até ele e acessa suas memórias através do chip, para descobrir o paradeiro do corpo das vítimas
    Esse fato me faz pensar que o chip tem uma falha de segurança, uma maneira de qualquer pessoa entrar no cérebro de um implantado, acessar suas memórias e até, controlar suas ações. Estaria Zender sendo controlado por outro psicopata e não ele?
    Conto bem escrito, bom argumento, com uma atmosfera noir/cyberpunk.
    .

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.